Meus caminhos: o lado doloroso da beleza
Hoje trago a vocês um depoimento #sincerão sobre um dos lados mais dolorosos da beleza: a cirurgia plástica. Na verdade, o texto escrito pela minha amiga e editora no jornal em que trabalho, a Anna França, discorre sobre uma intervenção reparadora, após ter se submetido a uma cirurgia bariátrica. Acredito que muitas pessoas vão se identificar com alguns pontos do texto (eu me identifiquei!). Eu recomendo SUPER porque não só está delicioso de ler, mas traz inúmeras reflexões para nós! Boa leitura!
Há sete anos, tomei uma decisão importante na minha vida. Esgotada, enorme de gorda e depois de muitos anos cuidando de filhos, trabalho e marido (nessa ordem mesmo), eu resolvi cuidar de mim. Com o peso muito além das medidas, em estado pré-diabético, percebi que colocava mais importância no que estava fora do que dentro.
Em uma avaliação profunda, percebi que não demoraria muito para não dar mais conta de tudo, ou seja, se não me cuidasse não poderia mais cuidar de ninguém. Uma conclusão que muitas mulheres levam tempo para chegar, tentando conciliar a vida de trabalhadora com a de mãe.
Mas só essa decisão não era tudo. Começava aí um calvário para me resgatar. Fui de profissional em profissional para conseguir obter a aprovação para a operação. Passei por cirurgião, cardiologista, nutricionista, psicólogos, entre outros, para fazer a tão sonhada cirurgia bariátrica. Foram meses a fio visitando consultórios e participando de palestras, que o convênio obrigava para autorizar o procedimento.
Um ano e meio depois, no dia 9 de setembro de 2011, eu consegui ser submetida à cirurgia. Aquilo soava como uma benção dos céus depois de tantos sacrifícios, carregando 50 quilos a mais nas costas. A coluna já não aguentava mais tanto esforço. O joelho, então, nem se fala. Até a sola do pé doía quando eu colocava o pé no chão de manhã.
Mas nem tudo é céu ou inferno nessa vida. Muito sério, meu médico disse que a cirurgia era só o início e representava 30% do trabalho, outros 30% seriam o que eu iria comer e 40% o que eu iria fazer de atividade física. Ou seja, 70% do serviço eram meus. E ainda tascou na minha cara que mais de 30% dos operados fracassam e voltam a engordar. Confesso que me bateu um medo terrível. Passar por tudo aquilo e fracassar não estava nos meus planos.
Mas para isso, era preciso encarar a comida de uma nova forma. Aquele conforto, a autoindulgência, a muleta de uma vida inteira diante das frustrações não poderia mais existir. Eu tinha de encontrar outra forma para resolver meus problemas e jogar minhas frustrações. Uma mudança brutal para quem já tem 40 anos e fez aquilo a vida inteira.
Quando fui liberada pelo médico para fazer atividades físicas não perdi tempo. Fui a uma academia e me matriculei na hora. Claro que o lugar era pequeno e atendia a um público do bairro, sem muita “mostração”. Mesmo tendo perdido mais de 20 quilos em dois meses, eu ainda exibia três dígitos na balança, então achei mais prudente começar pela hidroginástica. Fazia aula com senhorinhas divertidíssimas, que me ajudaram a suportar o meu começo desajeitado.
À medida que ia ganhando confiança e perdendo peso, passei a dar novos passos. Comecei a andar na entediante esteira, mas com ajuda da orientadora da academia, conseguia fazer 30 minutos, andando nove e correndo um, depois andando oito e correndo dois e assim sucessivamente. Quando consegui fazer meio a meio, andando cinco e correndo cinco, quase não acreditei. Perdi o medo daquelas aulas pesadas de body pump, body jump, deixando todos os bodes para trás junto com os 50 quilos a mais.
Nesse momento, a satisfação foi imensa. Imaginei que tudo seria mais fácil e leve na minha vida. Mas os anos foram passando e aquelas dores na coluna e no joelho, que todos os médicos diziam que era por causa do peso, continuavam lá. Por mais que eu fizesse ginástica para fortalecer os músculos, os avanços eram poucos.
O tempo ia passando e o com o avançar da idade, decidi que estava na hora de fazer as cirurgias plásticas reparadoras. Mesmo não tendo aquela barriga de avental, bem característica de quem opera estômago e perde muito peso, a queda das peles era inevitável. Eu tentava controlar, comprando sutiãs caros e reforçados e roupas bonitas.
Mas em casa, sozinha, eu via que aquele processo ainda não estava concluído. Tomei coragem e fui buscar um bom cirurgião plástico. E o convênio, mais uma vez, não colaborou muito. Liberava a plástica do abdômen, mas não das mamas. E eu ainda precisava retirar uma mama acessória que encheu de leite após a segunda gravidez.
Mas eu já tinha passado por tanta coisa, não ia ser aquilo que iria me barrar. Fiz de tudo para conseguir o máximo do convênio, e o que faltava eu completei do meu bolso. No dia 4 de agosto de 2017 entrava, enfim, na faca pra cortar tudo. E tenho de ser sincera: esse foi o passo mais dolorido fisicamente.
Cortes por todo o corpo me impediam até de tomar um banho sozinha. Foram 20 dias muito difíceis, quando até meus filhos passaram a cuidar de mim. Aliás, essa foi a melhor parte, saber que aquelas duas criaturas, a quem eu me dediquei tanto, agora estavam cuidando de mim.
Hoje eu respeito essas atrizes/modelos que vivem fazendo plástica. São pessoas muito fortes. Eu não faço isso tão cedo. Mas devo dizer que há efeitos “colaterais” nunca antes imaginados. A cirurgia do abdômen, onde a médica afasta a pele reforça o músculo e depois corta o excesso da pele, acabou me fazendo constatar que o professor de Pilates estava certo. Fortalecendo o abdômen você consegue tudo. Inclusive acabar com a dor na coluna, já que não tem mais nada flácido e os ossos não precisam fazer mais esforço, porque os músculos estão fazendo sua parte.
Reduzir as mamas também ajuda a melhorar as questões de peso e força nas costas. Enfim, fiz o que tinha de ser feito e não me arrependo. Não coloquei silicone, porque a médica me convenceu de que não precisava, afinal minhas mamas eram grandes e só a reconstrução, com a retirada da pele, daria um aspecto natural. Além disso, hoje, aos 50 anos, o peso das próteses poderia ser grande para uma pele com menos tônus. Isso sem falar que peitos grandes poderiam me fazer parecer mais gorda, o que eu não poderia nem sequer imaginar.
Continuo em recuperação, com algum problemas venosos e de pele, mas a cicatrização está perfeita e quando olho no espelho vejo um corpo que nunca tive. Nem na adolescência. Não sei o que o futuro me reserva. Mas só sei de uma coisa: eu aprendi, a duras penas, que se cuidar vai muito além da simples vaidade. Tem a ver com um processo interno, muito profundo, sem a superficialidade que muitos querem colocar. Ah, e vale muito a pena ter sobrevivido a tudo isso.
Anna França
Jornalista